A vida traduz-se em letras

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Deixa-me Sorrir

Tenho saudades tuas, Rita, tenho saudades tuas.
Porque estivémos juntos (e estarmos juntos significa eu seguir-te cegamente desde a adolescência) desde que me lembro, desde de que sei quem sou (que não sei), desde que eu, um rapazito que se isolava nos intervalos do liceu e se sentava nos bancos, longe do pátio do Camões (onde tu e os teus amigos estavam), me decidi a falar contigo (a tentar fazê-lo, pelo menos), eu que nunca o tinha feito, de repente
-Um dia destes queres vir a algum lado comigo?
e tu sorrias, sorrias, sorrias, não me respondeste
(pelo menos não foi um não)
e eu fiquei feliz.
O que me entristeceu foi que, passados cinco minutos, o Pedro na tua direcção a perguntar
-Queres sair comigo um dia destes?
e tu
-Sim, está bem
e eu com vontade de lhe bater, de te bater, ao Pedro sim e a mim nem uma resposta, mas que raio Rita, isso é coisa que se faça, ou se calhar...
ela esqueceu-se. Foi isso devem tê-la chamado, ou alguma coisa assim do género, chamaram-na, eu não ouvi, e ela esqueceu-se de me responder.

Já que me sento ao teu lado em geografia, vou por a minha teoria em prática: a tua mão está lá (disso eu tenho a certeza) em cima da mesa, e a minha, a deslizar em direcção à tua, como quem não pergunta nada e passa directo à acção (era isso que tu querias que o Pedro fizesse no teu encontro, eu sei porque o disseste em voz alta e eu estava lá, estava lá mas tu não me vias), a minha mão em cima da tua, a tua mão a fugir, e tu a sorrir, a sorrir, a sorrir.
No outro dia vi-te na rua, mulher feita de homem pelo braço, e eu não me controlei (impulsos reprimidos não se podem controlar, acho eu), simplesmente cheguei-me ao pé de ti, e
-Lembras-te de mim?
recebi aquela resposta que era a origem do meu amor por ti
-Não
e eu não me controlei
(penso que é impossível de se controlar impulsos reprimidos durante quinze anos)
-Um dia destes queres casar-te comigo?
(porque pensava que o casar-se era o ir a algum lado dos adultos, perdão pelo meu erro)
e não me bastou ter levado uma sova do Pedro, como tive de te ver a ir embora
(mulher feita de Pedro pelo braço)
a sorrir, a sorrir, a sorrir.

À Sophia, que nunca me desapontou.

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