Ontem passaste por mim,
(estávamos os dois a sair do Camões, eu acompanhado e tu sozinha, a andar pela rua com o teu andar que diz Eu sei o que quero, que afirma Eu sei o que quero, que berra Eu sei o que quero
(para mais tarde vir a saber que afinal não sabias)
aínda assim ternurento, próprio de ti )
mas não percebeste que eu estava lá.
Pois claro, eu não passo de uma sombra, de um fantasma que se arrasta pelas ruas do Saldanha, e tu, Senhora do Mundo com um andar possante
(definitivamente as parcas do destino não nos querem juntos)
que gritava Eu sei o que quero,
não, espera, era mais um berro que um grito, assim é que é,
e nós,
servos,
obedecíamos,
escravos,
às tuas ordens,
lacaios,
impotentes,
revolucionários,
à espera de uma falha no teu mandato de terror.
Nós é como quem diz eles, eles é que fazem essas coisas, eu cá não. Deixo-os a conspirar, não quero estar envolvido nisto. Gosto demasiado de ti. Acho-te demasiada piada. Apesar de não te conhecer. Apesar de só te ter visto uma vez, à saída do Camões
tu sozinha,
(não que precisasses de companhia)
e eu acompanhado
(porque eu era só uma sombra, um fantasma a arrastar-me pelas ruas do Saldanha).
Enquanto me arrastava, tu gritavas com o teu andar Eu sei o que quero, e começava a chover, chovia em cima de ti
(-Impossível, ela é inatingível!-gritava um revolucionário, nas suas reuniões secretas com o resto do povo oprimido)
ou então era eu que chovia, já não sei, a memória falha-me, agora vejo apenas uma mancha cinzenta
(malditas lágrimas!)
e já não sei, a sério que já não sei o que fazer. Falo contigo, não falo contigo, falo contigo, não falo contigo. Não falo contigo, é melhor assim. Quero amar-te em silêncio.
Sim, não te conheço. Mas pergunto-me se é mesmo necessário conhecer-te, é que eu gosto muito de ti, mas prefiro continuar assim,
à janela,
a chuva a escorrer,
uma lágrima,
duas,
três,
uma tespestade,
e já não há janela,
já não há marquise,
já não há casa,
já não há eu,
já não há quem te ame em silêncio.
Crónica dedicada À Ma Passante.
A vida traduz-se em letras
terça-feira, 20 de outubro de 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
apaixonaste-te pela moça?
ResponderEliminarEla estava com uma amiga --'
ResponderEliminarGosto bastante de ler o quue escreves, é relaxante.
Comentário estúpido, este. Mas pronto.
Kisses!
(está a ficar cada vez pior)
SE todo o cinzento mundo tivesse tanta poesia, valia a pena trocarmos todos os verões, todos os sóis, por bátegas de chuva, sem estação, a bater-nos sem parar nas janelas da nossa intranquila e saborosa criação...
ResponderEliminarTerá sido numa dessas situações que se começaram a desenhar poetase escritores? acredito que sim...
João
grande escrita, alongada, complexa, mas , ao mesmo tempo, ou por causa disso, transparente à nossa necessidade de interioridade e de silêncio. Grande abuso!
Um abraço do tamanho da metaescrita...
PS
o blog de Moral " renasceu"
www.emrcnaeca.blogspot.com