tag:blogger.com,1999:blog-41070628986900375092024-02-21T05:30:00.416+00:00Cartas Para o MundoA vida traduz-se em letrasJoão de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.comBlogger70125tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-17770093608009776532010-06-12T08:43:00.002+01:002010-06-12T08:46:49.036+01:00Retrato da VidaHá uma planta <br />Atrás da porta de minha casa.<br />Ontem, ao entrar em casa,<br /><br />A planta assustou-me.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-31731241425692039062010-06-12T08:42:00.001+01:002010-06-12T08:43:25.907+01:00EternidadeUm dia achei <br />que a eternidade fosse<br />(lá está)<br />eterna<br /><br />rapidamente descobri que era mesmoJoão de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-60116699118660491372010-06-12T08:39:00.001+01:002010-06-12T08:42:16.699+01:00VoltareiHoje decidi que vou voltar.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-91188626532985755652010-06-12T07:15:00.001+01:002010-06-12T09:15:26.490+01:00A Morte De Um PoetaTenho um amigo.<br />Ele é poeta.<br />Faz sonhos com palavras.<br />Ele é mais alto que eu.<br />E também tem cabelo mais comprido.<br /><br />Um dia ele disse-nos:<br />«Morri».<br /><br />Mas na altura ele não percebeu<br />Que nunca tinha vivido tanto.<br /><br />E escreveu.<br />A chuva misturou-se com as palavras<br />E as tílias deram forma ao poema.<br /><br />Ele destacou-se.<br />Todos o admiravam.<br />Poucos gostavam dele.<br />Era amado por uma<br />E respondia reciprocamente.<br /><br />Ele destacou-se:<br />No entanto<br />Ninguém percebeu que o poeta,<br />No final do dia,<br />Não era mais que uma tília<br />Ou um plátano<br />A correr na alameda do Camões.<br /><br />Tenho um amigo, sim,<br />Ele é poeta.<br />E ele não vai morrer nunca.<br /><br />Tenho um amigo.<br />E ele é poeta.<br />E é quando escrevo.<br />Ele fala-me ao ouvido.<br /><br />E o cadáver deixou-se levar<br />No centro das tílias da alameda do Camões<br />Contemplando os plátanos<br />Numa indiferença de morto<br />(Que ele não atingiu nunca)<br />E o olhar esbugalhado <br />Que contemplava o céu<br />Procurava um corvo<br />Que lhe dissesse Nunca mais.<br />Não chovia.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-50242083959031743572010-06-10T19:16:00.015+01:002010-06-11T06:24:04.567+01:00Ode Ao SorrisoSerá isto um sorriso?<br />Esgar inconstante de contracções involuntárias<br />E voluntárias,<br />Erguido pela força de uma obrigação que a<br />Etiqueta manda.<br />E não há mais<br />Espaço: só vazios claros como a escuridão<br />De uma boca que não se quer abrir.<br /><br />E se me dizem que o cérebero manda,<br />Acredito na prioridade do coração<br />E do<br />Espírito<br />E da<br />Alma.<br /><br />Queixo-me de quem não ri,<br />Queixo-me de quem ri,<br />Queixo-me do meu próprio riso.<br />Queixo-me de tudo o que é riso e não é,<br />Porque já não sei distinguir o que é ou não humano.<br /><br />Que há, afinal, no riso,<br />Senão o riso, ele próprio,<br />Reflexo incondicional da alma...?<br /><br />E se não houver riso,<br />Onde repousa a alma?<br />No mesmo lugar onde se encontra a poesia,<br />Onde a corça bebe água,<br />Onde a ninfa sai do rio,<br />Onde Vergílio Ferreira se consagra artista.<br /><br />Que se passa com o riso?,<br />Escondido nas bocas de quem enfernta o metropolitano,<br />Seres demasiados robóticos<br />Para se encontrarem na naturalidade de um sorriso,<br />Que implora para que o deixem sair<br />E não vem nunca.<br />Nunca.<br /><br />E entro numa carruagem,<br />Numa tentativa de sorrir por todos.<br />Olham-me como se fosse maluco...<br /><br />Mas o sorriso sorri ao progresso<br />Num esforço irónico imesurável.<br />O progresso não sorri ao sorriso<br />Porque de tal não é capaz.<br /><br />E há, ainda, sorrisos não-sorrisos,<br />Dos quais o riso se ri.<br /><br />E vamos progredindo:<br />Parabéns.<br />Esquecemos o sorriso.<br />Dá demasiado trabalho.<br />É um esforço inutil.<br />Não sorriam.<br />Conformem-se com o quotidiano,<br />E esqueçam o que vos quebra a monotonia,<br />Esqueçam o que vos enche a alma,<br />Esqueçam a vossa própria alma,<br />Ó racionalizações de seres racionais,<br />Que o cérebero de tudo vale,<br />E o sorriso vende-se a cinco cêntimos o quilo.<br /><br />Vou prostituir o meu sorriso,<br />Até que mo fodam incansavelmente,<br />Numa tentativa de inovação poética.<br /><br />Vou protituir o meu sorriso,<br />E foder o vosso quotidiano<br />De Metropolitano não sorridente.<br /><br />Vou prostituir o meu sorriso;<br />Atingir o término num orgasmo recíproco,<br />Que não será molhado mas sorridente.<br /><br />Ó perfeita criatura!<br />A tua carne de nada vale,<br />E o teu cérebero é pó.<br />A incapacidade de um sorriso<br />É o sinal derradeiro:<br /><br />Já ninguém é humano<br />Senão as crianças<br />E os adolescentes que se refugiam no Camões,<br />E sorriem debaixo das árvores.<br />Resultado: cortam-nos as árvores.<br /><br />Esquecem-se, no entanto,<br />Do lugar onde as Tílias criam raízes:<br />É o lugar onde a corça bebe água,<br />Onde a ninfa sai do rio,<br />Onde Vergílio Ferreira se apropria de um cadeirão<br />E escreve a sua arte;<br /><br />É nesse lugar,<br />Nesse único lugar,<br />Que nasce o sorriso.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-5998375324480469022010-02-16T09:18:00.012+00:002010-02-17T09:31:36.254+00:00Que Casa É Esta Que Não Tem Sombras?<div align="justify">Hoje está tudo muito claro, apesar de chover lá fora, hoje a minha visão não se turva com pequenos mares nos meus olhos, nem com nódoas nas folhas de papel; hoje, neste dia que nem sei qual é, não me aborreço, não me entristeço nem penso na merda que é a minha vida, hoje vou ser feliz, vou abraçar a filha que nunca tive senão por intercessão de sonhos que o Espírito Santo seguramente me providenciará, cabelos loiros como é óbvio, e olhos azuis, um pequeno corpinho ainda por florescer de uma jovem com dez anos que os taxistas do Saldanha admiram com as mãos no bolso. Hoje vou pintar um sorriso um sorriso na minha cara se ele não surgir naturalmente, recuso-me a estragar mais folhas de papel por culpa destes rios que acham uma nascente na minha cara; sim, hoje vou mesmo ser feliz, hoje não há velas nem quartos completamente escuros, hoje acendo as luzes todas da minha casa, na esperança de ser atingido por um clarão fugaz não de luz mas de alegria, acendo mesmo as luzes, a sério, juro-lhe que as acendo todas, não me olhe dessa forma, dirijo-me ao interruptor e clique, uma casa toda ela nova onde a minha filha poderá brincar sem medo das consequências ainda que com uma timidez de boa educação presente a toda a hora, mas no fundo no fundo, quem irá ficar mais reprimido pela timidez serei eu, que desconhecerei os cantos desta nova casa que se revelou, ai, porque é que ligou o interruptor, não estrague o momento, estamos prestes a fazer amor e conto-lhe apenas os planos para o resto da semana, não se chateie, não se aborreça, olhe para mim a descobrir o seu pescoço com beijos, olhe para mim a achar a curvatura dos seus seios, olhe para mim a descer a sua barriga a fim de encontrar o Génesis, apague essa luz que me encontro assustado, esta casa não é minha, esta casa não é minha!, a minha casa é toda ela escura e não há sombras senão a sombra geral que a cobre toda, não, apague a luz se faz o favor, não se iluda que com a luz acesa esta casa não é minha e não sou eu quem está a tentar fazer amor consigo, deixe-se lá de brincadeiras e apague a luz que neste momento parece-me que tem uma idade semelhante à da minha filha, aí está a erecção, essa obstinação de miudinha de dez anos excita-me, pelo que parece, mas agora a sério, apague a luz e deixe-me fazer o meu trabalho, prometo que um dia destes serei feliz, menti-lhe, é verdade, não será hoje, apague a luz que eu tento amanhã, amanhã, prometo, irei dar abraços e beijinhos à minha filha de dez anos que não possuo, amanhã ligo-lhe logo pelo raiar da aurora que é tão bonita a visão daqui do Tejo e ligo também a luz, numa atitude de inovação, numa atitude de rebeldia obstinada de gotinhas de chuva que caiem sem a minha permissão, hoje não choro e amanhã também não, vou mudar, prometo, vou mudar e conseguirei, um dia, viver nesta casa com a luz acesa, agora não, apague a luz que estava prestes a penetrá-la, apague a luz e deixe-me continuar por estes caminhos que bem conheço, por estes corredores sem segredos, por esta sombra enorme que invade a casa inteira, apague a luz e deixe-me neste engano geral que é a minha felicidade, apague a luz e deixe-me viver, apague a luz, apague a luz, apague a luz e prometo que a levo a sítios que não imaginou que existiam sequer, apague a luz e prometo milhares de coisas como Eu ligo-lhe amanhã, escusa de se enganar porque amanhã não haverá telefonemas para ninguém, também cuido que não se deva preocupar muito com esse pormenor, ambos sabemos que necessitamos apenas de uma noite e não mais, não se atrapalhe, estou apenas a ser sincero, mas se quiser uma mentira também não há problema: Eu amo-a. Eu amo-a tanto, muito mesmo, quero casar-me consigo e ter uma filha canonizada, mas vamos apenas preocuparmo-nos com hoje à noite; apague a luz, imploro-lhe, que estou a ficar deprimido, é que, sabe, é mesmo horrível viver nesta casa há quinze anos e não lhe conhecer os cantos senão por sombras, basta-me a claridade do dia de hoje em que os meus olhos não turvaram a luz de lágrimas, por isso apague a luz, por favor, apague a luz e eu prometo-lhe que.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-9291269690598157542010-02-14T00:01:00.004+00:002010-02-14T08:00:36.077+00:00Do Reprimir<div align="justify">O quarto estava escuro, como todos os quartos de uma história macabra como esta deveriam de estar. O homem chorava, amarrado pelas mãos ao tecto. O pés mal tocavam no chão. Implorava por perdão, que não aconteceria nunca mais. Não me importei. Empunhei o cutelo, e observei, divertido, a forma como as lágrimas fluíam com mais intensidade ao aproximar a lâmina do seu corpo. Afastei, aproximei, afastei, aproximei, uma incisão pequenina no abdómen, afastei, aproximei da cara, afastei. Ele chorava, e às lágrimas juntavam-se-lhe, agora, o sangue. Achei-me satisfeito. Óbvio que não era o suficiente, mas era satisfatório. </div><div align="justify">Arrastei uma cadeira e sentei-me mesmo de frente ao seu tronco, a um ou dois metros de distância. No outro dia, enquanto passeava, deparei-me com um velho num carro. Tinha os olhos fechados, e eu desconhecia se ele dormia ou não. Afastei-me. Não interessava, mas tinha sido um espectáculo fantástico. Como o gajo que se enforcou, há uma semana, na minha rua. Fogo, que espectacular! E recordava, satisfeito, até que fui acordado das minhas memórias por um soluço, proveniente da escumalha que se pendurava na minha frente.</div><div align="justify">-Satisfeito?, perguntei.</div><div align="justify">-Que mal fiz eu?, interrogou-me.</div><div align="justify">-Nasceste, falaste e exististe. </div><div align="justify">-Porque é que nunca me disseste que te incomodava? Escusava de ter forçado uma pseudo-amizade.</div><div align="justify">Ah!, com que então ele tinha forçado uma amizade comigo, hem?, está bem, está bem, então se ele força amizades, eu forço um cutelo a penetrar na carne do seu braço, a sentir no cabo a carne a ser cortada e o sangue a espirrar até atingir o osso.</div><div align="justify">-Porque tem mais piada assim.</div><div align="justify">O primeiro corte não me satisfez na totalidade. Fiz mais um, e mais outro, até que, por fim, aquele corpo vil e ensaguentado se deixou de mexer. Achava-se morto. Ou melhor, não achava, não achava nada porque estava morto. Ah, ah, ah. Deixei cair o cutelo, e sentei-me de novo. Fixei os seus olhos, que agora pareciam feitos de vidro. Melhor, muito melhor.</div><div align="justify">E assim me deixei ficar, por uma hora ou duas, a recordar velhos que não sabia se mortos ou não e enforcados na minha rua, com a diferença de me encontrar agora satisfeito.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-20570915565520056772010-02-13T15:30:00.000+00:002010-02-14T07:30:01.527+00:00Em Resposta A Quem Não Se Expressa<div align="justify">Em tempos passados, havia um rapaz que amou uma rapariga. A rapariga não o conhecia, mas não fazia mal; ele amava-la. Um dia, o rapaz começou a falar com a rapariga. E continuaram a falar. A cumplicidade das coisas levou a uma coisa e outra, mas não fazia mal; ele amava-la. </div><div align="justify">Então, a rapariga apaixonou-se pelo rapaz. E disse-lhe:</div><div align="justify">-Luís, estou apaixonada por ti.</div><div align="justify">E o rapaz retorquiu:</div><div align="justify">-Está bem.</div><div align="justify">E a rapariga, por apenas apaixonada que estava, afastou-se. Mas não fazia mal. Ele ainda a amava.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-21148358027631406702010-01-10T16:44:00.003+00:002010-01-10T16:57:02.468+00:00Explicações Em VãoPeço-vos desculpa. Tenho mais é que vos pedir desculpa. Um texto por semana, que vergonha! E nem vos explico um porquê. Mas pronto, ah e tal, perdoem-me. Vá, a verdade é que não me tem apetecido publicar nada. As minhas últimas crónicas, guardo-as só para mim. As que, normalmente, viriam para aqui, acabaram no caixote do lixo; sabem, não queria mesmo nada ter de vos contar.<br />A fidelidade, sabem, é importante. Daí explicar-vos isto. E de confessar que desconheço um grande mundo por aí fora. E que invejo muita gente. E que conheci gente importante nos últimos tempos. E que me apercebi de grandes mudanças em mim e no que me rodeia.<br />O ano novo? Porque é que não escrevi nada sobre o ano novo? Acham que deveria ter escrito? Posso escrever agora umas linhas pequeninas, não faz mal. Ano novo, e tal como toda a gente diz, vida nova (yac! que cliché!); as minhas mudanças principais ocorreram um pouco antes do dia trinta e um, mas não faz mal, pois não?, a verdade é que já não me escorrem lágrimas, e que decidi esquecer por completo certas e determinadas memórias (tanto quanto me for possível), é que, sabem, já estava a ficar farto de ser torturado constantemente pela minha memória, estava farto de ser carrasco de mim mesmo. Agora estou melhor, acho eu.<br />Caras novas. Vidas novas a rodearem-me. As velhas cercam-me e ameaçam com as suas bengalas, o neo-realismo em mim torna-se mais súbito do que eu esperava. Tudo se clareia e vejo, enfim, um final.<br />Cedo, cedo, cedo mas não demasiado, tudo terminará bem.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-34412523503434184342010-01-09T19:05:00.005+00:002010-01-09T19:40:27.564+00:00Inês Posta Em Sossego<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHghVb4OtAWNLQfoCO0_Fbm0_3GGZ5J0Ars73D3EsKDkEJ5_zu0lUbN5Ld2C1vtCgDqM8OVoH8vKWYslgpoHJBgUcopGAwR1OBPb_eqTE22KbNx-u1QH2ZtvNXjceN5LoACVXZDq-huUw/s1600-h/pintado.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 283px; DISPLAY: block; HEIGHT: 400px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5424818884136459410" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHghVb4OtAWNLQfoCO0_Fbm0_3GGZ5J0Ars73D3EsKDkEJ5_zu0lUbN5Ld2C1vtCgDqM8OVoH8vKWYslgpoHJBgUcopGAwR1OBPb_eqTE22KbNx-u1QH2ZtvNXjceN5LoACVXZDq-huUw/s400/pintado.jpg" /></a> Estavas, linda Inês, posta em sossego. Não que eu quisesse, mas se tu me dizes<br />-Eu amo-te Tiago<br />eu fico sem saber o que dizer e acho por bem bater-te, uma estalada na cara nem eu sei bem porquê, ao cair bates com a cabeça na mesa e repetes<br />-Eu amo-te Tiago<br />ofereço-te mais dois pontapés e é logo uma confusão<br />(corre um fiozinho de sangue da tua testa)<br />porque eu não sei o que fazer em casos destes, Inês, nunca me disseste o que deveria fazer depois de te bater, por isso fiquei a olhar para ti e a pensar na altura em que me apresentaste aos teus pais, que tinhas de ir à casa de banho, o teu pai a perguntar<br />-Isto é o melhor que ela arranja?<br />a tua mãe a apontar-me o rolo da massa como se tratasse de uma faca<br />-Espero que faça a minha filha muito feliz senão<br />a tua mãe a correr para a cozinha<br />-Ai que o jantar se está a queimar<br />e eu sem saber o que fazer, porque não me tinhas dito, Inês, o que deveria fazer, ao contrário de quando me dizias aquelas pequenas coisas do dia-a-dia<br />-Por favor Tiago não te esqueças de comprar leite por favor Tiago não fumes mais por favor Tiago não me batas por favor não por favor Tiago não me batas mais por favor<br />mas agora estás no chão,<br />(o sangue da tua testa é já um pequeno rio)<br />penso que morta, posta em sossego, com uma expressão no rosto como quem pergunta Porque é que fizeste isto, mas também não tenho uma resposta, é só que gosto muito de ti, Inês, mas acho que não te amo, e não gosto quando dizes isso, tu bem sabes, porque sempre que dizes<br />-Eu amo-te Tiago<br />é porrada garantida, uma estalada ou duas até caíres, mais alguns pontapés, e ficas tão linda, Inês, com o sangue a escorrer-te da testa, quase me esqueço que não te amo, que só gosto de ti apesar de estarmos casados, apesar de vivermos juntos, apesar de dormir contigo todas as noites, não te amo, Inês, por isso não me venhas com<br />-Eu amo-te Tiago<br />que isso eu não te admito, até porque já estou a ficar cansado das perguntas da polícia, dessa corja incompetente, que me diz<br />-Não se preocupe Senhor Doutor que a gente apanha o safado que fez isto à sua mulher<br />e eu<br />-Obrigado<br />cheio de agradecimentos,<br />eu<br />-Obrigado<br />para um mês depois essa mesma corja me dizer que a minha mulher tropeçou e bateu com a cabeça na mesa acabando por morrer, quando eu bem sei o que aconteceu mas não digo, com medo que me ponham na prisão, por isso respondo apenas<br />-Obrigado<br />a esperar que eles não percebam nada, porque quero estar aqui, Inês, e queria dizer-te<br />-Desculpa<br />mas é só que eu não te amo, apenas gosto de ti, apesar de nos termos casado, apesar de já termos vivido juntos, apesar de já termos dormido juntos durante muitas<br />todas (as)<br />noites, e por tudo isso, Inês, não me venhas com<br />-Eu amo-te Tiago<br />que isso eu não te admito mesmo, é melhor que fiques caladinha antes que dê uma ou duas estaladas na cara e mais alguns pontapés,<br />(o sangue era agora um pequeno mar)<br />talvez porque não te quero ver mais, Inês, porque só ficavas linda quando um fiozinho de sangue te escorria da testa,<br />-Desculpa<br />e eu agora já não sou casado, agora vivo sozinho, agora durmo sozinho,agora estou sozinho e incapaz de amar alguém para além de ti com um fiozinho de sangue a escorrer-te da testa<br />-Desculpa.<br />Estavas, linda Inês, posta em sossego,<br />(o teu sangue devia ser um oceano, enchia a sala inteira)<br />comigo no teu funeral, a chover, a chorar, de sobretudo preto, a pensar que Camões se tinha enganado a escrever aquela vírgula naquele verso, porque na verdade<br />estavas linda, Inês, posta em sossego.<br /><br /><br /><br />Trabalhos Artísticos por Diana Vozone, consoante interpretação pessoal da crónica.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-42189843595734476872010-01-02T07:32:00.005+00:002010-01-02T07:48:03.297+00:00Quando Os Olhos Se Fecham<div align="justify">Saiu apressadamente, correndo porta fora. Ainda se vestia quando estava a sair do meu quarto. Abriu a porta da minha casa e, subitamente, parou.<br />- Então...vemo-nos mais logo?<br />E pronto. A felicidade, sim, a felicidade de ela querer estar comigo.<br />-Sim, claro que sim. Depois mando-te uma mensagem, ou isso.<br />Ela sorri-me. Eu sorrio-lhe. Ele dirige-se ao carro dela, que está estacionado à porta de minha casa. E aconteceu tudo tão devagar...<br />Ele estava zangado (ou então era...bem, não sei, alguma coisa seria), e levou a mão dele de encontro à cara dela. Ela cai. E eu observo. Observo o pé dele a baloiçar para a frente e para trás, para a frente e para trás, para a barriga dela e para longe da barriga dela, e ela tosse, e ela cospe sangue, e eu observo. Mudo. Aterrorizado. Impotente pela faca cúmplice que, entretanto, me fora aplicada ao pescoço.<br />Pela altura em que ele termina, ela estende-se pelo passeio. Corre-lhe sangue de vários lugares diferentes do corpo.<br />A minha boca ainda sabe à boca dela. O meu corpo ainda tem o seu cheiro. A memória dela e da nossa noite ainda prevalece. Mas foi confrontada com a realidade. E a realidade é que ela está estendida no passeio, e corre-lhe sangue de vários lugares diferentes do corpo.<br />Ninguém viu. Devia ser demasiado cedo para as pessoas verem. Ou então viram e preferiram não ver. Fecharam os olhos, mas aposto que eles não vêem nada quando fecham os olhos. Eu vejo. Eu vejo, sabem? Eu vejo.<br />É mesmo fodido, fechar os olhos e lembrar-me de tudo.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-34333615846830753892009-12-29T06:32:00.006+00:002009-12-29T07:00:18.097+00:00Odeio O CamõesAntónio Lobo Antunes diz "Soube que era um génio quando comecei a encontrar o romance nas montras das livrarias; quando o retrato principiou a aparecer nos jornais; quando dei a primeira entrevista à televisão."<br />Ora, eu tenho quinze anos. Ainda não encontro o romance nas livrarias, não compreendo bem porquê, chego-me lá e pergunto se tem algum escrito de João de Matos e a resposta é sempre negativa (discriminação, certamente, pela minha idade), cuidando que nas livrarias não me acho.<br />Eu soube que era um génio quando, no sétimo ano, ganhei um concurso de escrita em inglês. Acho que nem concorri pelo prémio (o que é certo é que a Escola Secundária Eça de Queirós ganhou um laboratório de línguas, segundo sei), foi mesmo pelo reconhecimento. Quando me entregaram a carta a dizer que tinha ganho, julguei-me uma estrela como aquelas que se colam na tela do cinema, como aquelas que se penteiam durante duas horas e maquilhagem no género feminino.<br />Comecei a sair á rua apenas na segurança de dois amigos (todas as estrelas têm guarda-costas), depois de passar duas horas em frente ao espelho a arranjar o cabelo, e, antes de passar por cada esquina, tomava especial atenção aos paparazzi. Eles nunca estavam lá, digo, eu nunca os vi (aqueles malandros sabem esconder-se bem), mas sei que sou um génio.<br />António Lobo Antunes deve ter imensos fãs a pedirem-lhe autógrafos (eu sou um deles). Eu, bem, não é que não tenha fãs, tenho fãs, tenho fãs que lêem as minhas crónicas e que me dizem Ai meu Deus que tristeza descomunal, tenho fãs que lêem a minha poesia e me dizem Ai meu Deus que grotesco, tenho fãs que lêem os meus contos e me dizem Ai meu Deus isso não é um conto é uma crónica, mas tenho fãs. Para dizer a verdade, desconfio que hei-de voltar a contratar o Tomás e o Pedro como guarda-costas. É que no Camões tenho imensos fãs.<br />Ainda no outro dia, quando estava na companhia da Bia e do Jordann, uma rapariga do décimo segundo ano chegou-se ao pé de mim<br />-Tu não és aquele que<br />e eu sim, sou aquele que escreve tanto e que merece reconhecimento literário, a retirar já a caneta do bolso para preparar o autógrafo<br />-...falou muito mal da Lista C em tempo de campanha?<br />Política. Outra vez. E no entanto, nunca a Literatura.<br />A culpa deve ser dos funcionários (só pode), porque neste momento odeio o Camões.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-70555333951333297052009-12-23T07:37:00.009+00:002009-12-23T08:23:10.540+00:00Respondendo a Marta<div align="justify">Querida Marta,</div><div align="justify"></div><div align="justify">adoraria poder dizer-te que está tudo bem comigo. Acontece que não está. Não está nunca, e não sei se alguma vez estará. </div><div align="justify">Hoje o Bernardo retratou a voz de todos os que por aqui passam: que isto é tudo muito depressivo, que isto é tudo muito triste, que Ó meu Deus tu vais-te suicidar, que, em suma, parvoíces. </div><div align="justify">Marta, juro que já não o faço de propósito. Mas como poderei eu escrever sobre o sol, se o ceu está sempre coberto de chuva. Estamos no Inverno. É normal que assim seja. E eu sei que tu não pensas o mesmo que os outros. </div><div align="justify">Sabes, Marta, hoje chove. Chove tudo, aqui no seminário: chovem as nuvens, chove o piano lá dentro que contrasta bastante com o sol da guitarra que berra desafinada, chovem as paredes e chovo eu. Desculpa se manchar esta carta com lágrimas, desculpa se não a conseguires ler por causa disso mas, Marta, eu não consigo. Já não o evito e já o faço sem consciência. </div><div align="justify">Pensando melhor, acho que não te vou conseguir enviar esta carta. Custa-me demasiado preocupar-te com os meus problemas. Porque eu não quero que te preocupes. Está tudo bem. Publicarei isto, talvez, no meu blogue. Como uma nova carta (e eu que raramente respondo a correspondência nunca te falhei em nada) para alguém inexistente e que eu sei que é bem real. </div><div align="justify">Marta, por aqui isto não vai bem. Já não me lembro de ti, já não me lembro do toque da tua pele, já não me lembro da arte dos teus lábios tocando levemente os meus...já não me lembro de quem amo. E sofro, quiçá, por isso. Sonho contigo, acordo e desapareces. Escrevo para ti no escuro, acendem uma luz e desapareces. Espero por ti na escola, tomo consciência de que não sou nada e desapareces. Será que, por uma vez ou outra poderias ficar? É que tenho muitas saudades tuas, e a escuridão com que escrevo esta carta começa a ferir-me os olhos. As velas nunca iluminaram o meu caminho. </div><div align="justify">Tenho desculpas a apresentar-te: sou fraco e não resisti à tentação. E garanto-te que me custa a admiti-lo, porque encontrar um espaço isolado neste sítio onde ninguém me veja...é difícil. Será que é por isso que não me amas? Ou será por eu ser eu? Quando te poderei dar a mão de novo? Quando poderei inalar o teu doce cheiro?</div><div align="justify">Ó Marta, a falta que me fazes! Ninguém poderá nunca imaginar! Nem eu o concebo, sequer! E agora grito o teu nome(Marta! Marta! Marta! Marta!), esperando que abras a porta deste quarto de onde te escrevo, acendas as luzes que a escuridão começa a ferir-me os olhos, deslizes levemente até à secretária, e não te peço um beijo, não te peço um beijo, não te peço um beijo, não te peço um beijo, não te peço um beijo até que tu não mo dês; o que preciso mesmo, é de te dar a mão, e que tu coloques a tua boca levemente sobre a minha, para recordar o tempo em que era vivo. </div><div align="justify">Marta, chamaram-me de "artista". E no entanto vejo mais arte na música que chove das mão do Tomás, lá dentro, ao piano, do que nas palavras que te escrevo. </div><div align="justify">E por isso não te envio esta carta, por consequência das mil e uma utilizações de uma vela. Esta carta é uma delas. </div><div align="justify">A décima quarta sonata de Beethoven soa, soa, e os acordes, fantasmas, atravessam a parede do meu quarto não sei bem como (talvez tenham entrado por onde a água da chuva entrou, hoje á noite), penetram o meu ser e, de repente, és tu no meu quarto, e eu envergonhado de caneta na mão. Rebenta a caneta, como uma bolha de sabão da autoria de uma qualquer criança, rebenta a memória que tenho de ti, vêm as saudades que me consomem e, por consequência, a nostalgia. </div><div align="justify">Marta, quando te poderei voltar a ver? Quando poderei voltar a sentir os teus lábios nos meus? Quando te poderei dar a mão? </div><div align="justify">Hoje à noite vou poder utilizar o meu telemóvel, e já sei qual o primeiro número a marcar. </div><div align="justify">Deixo-me na indecisão do enviar ou não enviar ou publicar no meu blogue o raio da carta, faça o que faça só te garanto que será acompanhada por uma sonata de Beethoven, por um pedido de desculpas por não escrever sobre o sol há tanto tempo, por um beijo meu, pela minha nostalgia, e pela esperança de que um dia esperes por mim quando eu for ao teu encontro.</div><div align="justify"></div><div align="justify">João</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-23620335323491957622009-12-19T08:45:00.005+00:002009-12-19T09:03:51.123+00:00A Essência da Maçã VerdeSempre que entravas no metro, eu já estava lá à tua espera (sabia que entravas uma paragem depois de mim, sabia que nunca te atrasavas, sabia que gostavas de andar na primeira carruagem). Se me vias? É óbvio que me vias, sim, está bem, não falavas comigo, mas vias-me, tenho a certeza disso.<br />Lembro-me da forma como tu entravas e na forma de como todos os outros falavam nos pavorosos minutos do sismo de ontem à noite. Se tu me falavas de sismos? Não, está bem, não me falavas de sismos, mas tenho a certeza de que querias falar e tenho também a certeza de que eras demasiado tímida para o fazer. Tenho a certeza de que te lembras de mim. Aposto que não havia assim tanta gente a entrar no autocarro de Dostoievsky na mão, aposto que não havia ninguém de fato de seda, aposto que reparavas nos meus arranjos já que eu só me arranjava para tu reparares.<br />Lembro-me de passares por mim e de tentar cheirar o teu perfume que cheirava a maçã. Verde. Maçã verde. E é por me ter vestido de fato, por ter andado de Dostoievsky na mão, por ter tentado cheirar o teu perfume mil vezes que eu sei que tu te lembras de mim.<br />Eu também tentava não me esquecer de ti (excepto quando trazias um livro de Paulo Coelho, ou de Nicholas Sparks) dos teus cabelos, dos teus olhos, do teu perfume (que cheirava tanto, tanto, tanto a maçã verde) e, subitamente, o condutor do autocarro vira o volante numa curva apertada e tu cais sobre mim, o teu corpo a tocar no meu, e eu sei que fizeste de propósito. Com tanta tecnologia que há hoje em dia, toda a gente contraria as leis da física, mas as leis de um perfume que cheirava assim tanto a maçã verde, essas oh!, essas não se contrariam.<br />Não percebi porque é que deixaste de andar na primeira carruagem do metro das oito e trinta e sete, mas julgo que em breve voltarei a sentir o cheiro da maçã verde.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-2495857257374616232009-12-16T18:50:00.008+00:002009-12-17T09:27:45.054+00:00Manifesto Anti-SparksMorte a Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Estou cansado de escrever crónicas. Digo isto, não porque já tenha escrevido muitas, mas porque estou mesmo cansado de crónicas. Mas só há uma coisa que excede o meu cansaço pelas crónicas: Nicholas Sparks.<br /><br />Almada, peço-te desculpa por te tentar encarnar desta forma tão própria (e possivelmente redutora) da minha pessoa, mas acho que é mesmo necessário. Isto porque hoje, na minha aula de Português, três pessoas, não, espera, ouve bem, TRÊS!!! pessoas decidiram apresentar a "obra" que deviam ter lido ao longo do período e todas falaram sobre Nicholas Sparks! Mas que raio?!<br /><br />Morte a Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Morte aos que o seguem ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Almada, estou a exagerar. Tenho a certeza disso. Também tenho a certeza de que, depois da tortura que foi esta aula de Português, se alguém me diz a palavra "beijo" eu suicido-me. E sei também admitir os meus erros: ao longo da minha vida, sempre afirmei que Nicholas Sparks (estou farto de lhe dar um respeito que ele não merece, chamar-lhe-ei de agora avante de "homenzinho") era o pior escritor do mundo. Agora percebo que o homenzinho conseguiu transmitir-me um sentimento: não, não fiquei perdidamente apaixonado, mas acredito que sou capaz de ter ficado perdidamente enojado.<br /><br />Morte a Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Morte a quem transforma o Amor numa sensação tão boa como mastigar meias utilizadas durante o mês de Junho inteiro!<br /><br />Suicida-te Sparks!!<br /><br />Morre e deixa esta geração em paz!<br /><br />Quem gosta de Sparks não é um quem, mas um quê!<br /><br />Quem gosta de Sparks gosta de comer meias sujas!<br /><br />Quem gosta de Sparks que morra também!<br /><br />Sparks serve para nos mostrar que o raio de um livro pode ter um final somente lucrativo!<br /><br />Sparks tem os maiores bolsos do mundo!<br /><br />E há quem goste! E há quem aplauda! E há quem siga! E há quem compra! E há quem peça autógrafos! E há quem seja louco!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Sparks é o declínio de uma sociedade!<br /><br />Sparks só conhece a teoria de um beijo!<br /><br />Ler Sparks é comer massa crua!<br /><br />Se Sparks é Americano, então tenho orgulho em ser Português!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Sparks escreve a Literatura dos cães!<br /><br />Se Sparks fosse queimado vivo, o mundo renderia muito mais!<br /><br />Sparks produz saliva por uma população inteira!<br /><br />Sparks não é contemporâneo! Sparks é estupidez intemporal!<br /><br />Sparks escreveu quinze livros e mudou apenas o nome das personagens!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Sparks é o apocalipse já há muito profetizado!<br /><br />Sparks vem trazer terror ao mundo com os seus beijos intermináveis!<br /><br />Sparks não escreve sobre amor; ninguém que ame verdadeiramente pode dizer o que ele diz!<br /><br />Se Sparks conhece o amor, eu prefiro não o conhecer!<br /><br />Se Sparks é inteligente, prefiro ser ignorante!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Morte aos cordeiros que criticam seguindo o Sparks pastor!<br /><br />Morte a todos os que só querem ler Sparks!<br /><br />Sparks não escreve; vomita!<br /><br />Quem só lê Sparks não lê; engole vomitado!<br /><br />Sparks é nojento!<br /><br />Sparks dispõe de um "toque de Sparks" que lhe permite transformar tudo o que toca em algo nojento!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Enterrem o Sparks como favor à Humanidade!<br /><br />Sparks dá um melhor contributo à Humanidade morto do que vivo!<br /><br />Sparks envergonha a América por ter nascido lá!<br /><br />Sparks é mentiroso!<br /><br />Sparks é asqueroso!<br /><br />Quando leio Sparks tenho vontade de ser analfabeto!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Deviam torturar Sparks obrigando-o a ler tudo o que escreveu!<br /><br />Sou contra a pena de morte, mas mudo de decisão se estivermos falar do Sparks!<br /><br />O homenzinho é assassino e matou a Literatura!<br /><br />Morte à ignorância das Margaridas, e das Marias, e das Anas, e das Amélias, e dos que lhe mentem dizendo que é bom!<br /><br />O maior castigo que Sparks tem é o actual: todos os fãs lhe mentem dizendo que ele escreve bem!<br /><br />Morte ao Sparks ZÁS-TRÁS-PÁS!!<br /><br />Sparks é o cúmulo do comercial!<br /><br />Sparks é tão repetitivo, que o seu próximo êxito será um livro com uma frase repetida mil vezes!<br /><br />E há quem o ame! E há quem realize o que ele escreve! E há quem o adore! E há quem guarde fotografias dele!<br /><br />Se não matarem Sparks morro eu de desgosto!<br /><br />Vende Sparks Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende abaixo a Literatura e Vende Sparks Vende Vende Vende Vende Vende Vende Vende e Morre!<br /><br />Sparks demonstra que nem tudo o que é made in America é de qualidade! Sparks é a encarnação da estupidez! Sparks não pode ser verdadeiro!<br /><br />Morte a Sparks (e termino Almada) ZÁS-TRÁS-PÁS!João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-62499679748457064832009-12-16T18:16:00.007+00:002009-12-16T18:48:21.688+00:00O Que Acontece Depois Do FinalDesce a cortina, termina a peça.<br />O actor despede-se com uma vénia do público que aplaude entusiasticamente. E uma vénia, e duas, e três, e um sorriso, e muitos sorrisos, e abandona o palco. Vai de encontro ao resto do elenco. Fala do seu desempenho medíocre para que alguém lhe diga que foi excelente. E desenha um sorriso na seu própria cara.<br />Depois, tudo terminado (peça, celebrações, olhares e comentários indiscretos sobre os beijos que os membros do elenco trocavam ilicitamente), dirige-se a um espelho. E já não é ninguém.<br />Tudo terminou quando o actor se despediu do público, percebem? Não sei se me faço entender, mas um actor só será actor enquanto pisar um palco. E deixou de o pisar no momento em que se inclinou para fazer aquela vénia.<br /><br /><br />Ó actor, eu julgava-te tão humano...e dei por ti a seres um idiota. Tu bem sabes que acredito que os humanos possam ser idiotas, mas tu actor, tu passaste os limites.<br />Não tentes ser humano fora do palco, que só o serás se falares por palavras de outrém. Tenho pena de ti, actor, por te cingires a um guião, a um destino.<br />Olha, talvez seja a diferença entre a minha pessoa e a tua, actor que te revelas ao espelho, que eu crio personagens, e tu encárna-las. Serás melhor ou pior que eu? Nem um nem outro, mas não te considero humano.<br /><br /><br />Ó actor, que fizeste tu para mereceres tanto rancor da minha parte? Foi pelas tuas atitudes? Foi por teres pensado no que pensaste?<br />Olha, vou ser muito sincero: apesar de não te considerar humano, não estou zangado contigo. Até compreendo a tua tristeza: só no palco és humano. E deve ser horrível estar condicionado a uma peça de teatro para atingir a humanidade.<br /><br /><br />Actor, só te vou pedir uma coisa: aproveita o que não tens. Aproveita o não seres humano, que isto é (posso te garantir) um grande fardo. Sim, o maior peso é mesmo ser-se humano. Por isso é que tantos não o são.<br />Mas não desistas nunca de viver, actor, deixa isso para poetas e cronistas e suspiros seguidos de lágrimas, já percebi que isto de sofrer não é bem para ti. Não chores, actor, não chores, não humano o suficiente para chorares. Não penses nisso, actor, larga esse pedacinho de vidro, já te disse mil vezes que, apesar da tua vida humana terminar naquela vénia, não te podes matar, visto o facto de não poderes nunca imitar um escritor.<br />Actor, tenho-te a dizer para nunca acreditares no que escrevo. Tenho uma tendência enorme para mentir. Consequências da escrita, talvez.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-47288953388106183912009-12-10T19:17:00.002+00:002009-12-10T19:23:58.562+00:00Acontece Que Não Pode Ser- O senhor desculpe, mas isso não pode ser.<br />- E não pode ser porquê?<br />- Porque acontece que não pode ser.<br />- E não pode ser porquê?<br />- Ouça lá; eu vim para aqui beber um café descansado, e não estou para ser chateado. Por isso, ou o senhor me traz o raio de um café decente, ou vou ter de pedir o livro de reclamações!<br />- E o senhor quer-me explicar qual é o mal desse café?<br />- Não tenho nada a explicar.<br />- Eu preciso de uma explicação, no mínimo.<br />- Pois, mas acontece que não pode ser.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-12798509832127923562009-12-08T12:16:00.009+00:002009-12-11T06:38:05.170+00:00Explicação De Um Não À Nádia<div align="justify">Que dirás tu, Nádia, quando eu quiser entrar na noite escura?<br /><br />Nádia,<br />vemo-nos lá, nas reuniões, no metro, onde quer que seja, na escola, nas aulas, onde quer que seja, vemo-nos lá e um sorriso, sorrio, sorris-me, sorrio por dentro e pergunto-me se tu também sorriste por dentro, se também ficaste um pouco mais quentinha que hoje faz frio visto o facto de estarmos no Inverno, Nádia, eu olho e tu não me olhas, o que se passa, estás zangada?, não, não, eis o teu olhar, que alívio!, estava a ver que estavas zangada comigo, e tu coras e eu sorrio ainda mais, e tu baixas o olhar a sorrir também, e eu a não caber em mim de felicidade, de calor, de estar no Inverno e não estar, e uma professora a perguntar pelos meus Hausaufgaben, e eu Nein, Ich habe vergessen, e por um momento não sorri não fiquei quente nem fiquei no Inverno não ficando, só por um momento juro, e por culpa da professora, por culpa dela não te escrevo nada há uma semana por culpa dela não te recito um poema lírico qualquer há uma semana por culpa da professora não te vejo há uma semana e estou (digamos que) triste, estou certo que tu também porque há uma semana que não sou humano, visto o facto de não te recitar nem escrever nada há uma semana, Nádia, não fiques triste não chores que eu não quero que tu chores é que sabes, olhar-te assim e ver-te sorrir é bom é tão bom, mas depois este ter de te escrever coisas bonitas e felizes quando na verdade não é em ti que penso mas em quem me cobre com um manto negro chateia-me bastante, a sério, não suporto isto de ter de te mentir, por isso paremos nos sorrisos que já são demais paremos nos corares que já são demais paremos nas trocas de olhares mesmo em frente à professora de alemão que já são demais, porque eu sei, Nádia, eu sei que ninguém vai ler isto do príncipio ao fim<br />-As tuas crónicas são tão grandes que eu não tenho paciência para as ler<br />mesmo tu, Nádia, não as leias que eu só quero que leias as coisas bonitas que te escrevo (ou que te escrevi), não leias que me quero matar porque não quero não leias que eu ainda a amo que eu não amo, já te disse mil vezes que não sou eu quem escreve mas quem toma conta da minha mão quando me sento no sofá de computador ao colo não sou eu juro!, Nádia, tudo isto para te dizer que se trocamos olhares então trocamos olhares se trocamos sorrisos então trocamos sorrisos se trocamos corares então trocamos corares, mas não me peças um beijo porque, para dizer a verdade, não te vou responder que sim, mas também acho que não te vou dizer que não, Nádia, não te inclines, já te disse que não te vou beijar, Nádia, não me ames que eu já te disse que podemos trocar olhares e sorrisos e corares à vontade mas não beijos e vai daí talvez não talvez sim, porra Nádia!, mas que porra de indecisão, para que é que te foste inclinar e pedir-me um beijo se sabes que eu quero apenas sorrisos e olhares e corares e mais nada visto o facto de ainda não a ter esquecido e de ela ainda me mandar cartas, ainda no outro dia me mandou uma a perguntar se eu estava bem e eu respondi que não que estou severamente deprimido e que me receitaram Escitalopram e que eu quero tomar o raio dos comprimidos todos de uma só vez a ver se me esqueço da depressão com a mesma mão com que escrevo, olha a ironia!, e ela nada ela muda ela em silêncio, porra Nádia, não vês que ela não me responde e que eu não te posso beijar, não vês que sofro, não te posso recitar a poesia bonita de Camões e Baudelaire deprimido (vai daí talvez possa), recuso-me, porque o silêncio, esse sim, é a pior resposta, e eu Nádia, não estou feliz para trocar olhares e sorrisos e corares, porque estou prestes (se é que já lá não estou) a entrar na noite escura, e na noite escura, Nádia, não se trocam sorrisos e olhares e corares, por isso desabitua-te da poesia de Camões de Baudelaire e da minha que na noite escura eu não ta vou poder dar, visto o facto de ela não me responder, e o silêncio ser a pior resposta.<br /><br />Por isso, agora pergunto-te: que dirás tu, Nádia, quando eu entrar na noite escura?</div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify">Em Homenagem a A.L.A., por me mostrar o bom da noite escura.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-23052545112615293632009-12-01T11:04:00.006+00:002009-12-01T19:35:47.186+00:00O Pesar Da MemóriaHoje acordei, vindo de um sonho. É engraçado, não foi um sonho, mas também não foi um pesadelo. Se calhar foi uma memória, sim, é capaz de ter sido uma memória da qual eu já não me recordava.<br />O que é certo é que era uma memória dolorosa, do tempo em que eu ainda te dava a mão, como uma criança ignóbil quando comparado contigo, do tempo em que eu te sorria e recebia um sorriso como resposta (hoje recebo uma espécie de espasmo), do tempo em que eu te amava e me sentia correspondido. E como aquela memória veio para ficar, sento-me no sofá e vejo a tinta da parede a falar comigo por estalos, deixo que a monotonia da vida se entranhe em mim, e dirijo-me à cozinha. Ainda com aquela memória dolorosa, deixo-me levar para a cozinha, contigo de mão na minha, cuidando que abro a gaveta da cozinha, uma faca no meu pulso, e de repente batem à porta. Era a minha mãe a querer saber se estava bem, a querer saber se tenho andado a comer bem, e eu a pensar que não devia nunca ser vizinho da minha mãe porque depois há chatices destas: uma pessoa quer suicidar-se e aparece a mãe a querer saber se tenho andado a comer bem.<br />Como julgo que seja impossível alguém suicidar-se depois da mãe lhe ter perguntado se andava a comer bem, lá vou eu para o sofá ver as horas arrastarem-se.<br />E elas arrastaram-se, disso não haja dúvida, tanto não há dúvida que adormeci, deixei-me levar pelas horas, pela monotonia de estar vivo, pela tua mão na minha, e adormeci. Lá fui eu para o nosso anfiteatro outra vez, e lá estavas tu, a sorrir-me em resposta, a dar-me a mão, a corresponder ao meu amor, e eu, feito parvo, a dormir, julgo, desconheço se dormia ou se morri ali mesmo.<br />Devo ter adormecido, pois subitamente dei por mim na minha sala, no meu sofá (novamente), e o meu telefone a tocar porque o Tomás queria saber se eu queria ir à bola com ele (já lhe disse tantas vezes que não gosto de futebol), e eu só me lembrava da Margarida, nos cabelos da Margarida, no corpo da Margarida, no riso e no sorriso da Margarida, cuidando que fui ao meu quarto, abri a segunda gaveta do meu armário e enchi a mão de Escitalopram, pronto a por aquilo tudo na boca, e lembro-me do Tomás, do raio do Tomás, que me fez lembrar do raio do jogo do Benfica que já prometi ir ver com ele na próxima semana, que não sou pessoa para faltar às minhas promessas, largando os comprimidos no chão, volto ao sofá, volto à monotonia da vida, volto a ver as horas a arrastarem-se.<br />Liguei a televisão, mudei de canal de dois em dois segundos, e fiquei a pensar no nada. Minto, pensava, se calhar, no porquê de me querer suicidar. Talvez pela Margarida. Talvez porque ela fugiu com um neurocirurgião, e eu fiquei por onde não devia. Mas porquê matar-me? Basta ignorá-la, basta não falar com ela, basta que ela não fale comigo. Não vou por término à minha existência por ti, não julgues que vou porque não vou.<br />Pensava eu isto, e decido ir ao meu e-mail. Na caixa de entrada um mail da Margarida a diferenciar-se, de assunto "Tudo bem?", e o anfiteatro a voltar, a Margarida a voltar, as mãos da Margarida, a nostalgia da Margarida, as saudades da Margarida, a Margarida a voltar, cuidando que nem respondo, quero responder mas não respondo, visto estar a dirigir-me novamente ao quarto, procurar a minha Magnum 357, procurar o céu da minha boca.<br />Desculpa não te ter respondido, mas julgo, não tenho a certeza depois daquele estampido, mas julgo que adormeci.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-15458134362976683242009-11-30T11:34:00.005+00:002009-11-30T11:54:27.053+00:00O Que Me Custa TrabalharNão sou parvo ao ponto de te dizer que não estou bem, que choro todos os dias, não sou parvo para o admitir à tua frente. Mas a verdade, sabes, é que as recordações (as boas que tenho de ti, pelo menos) não se esquecem com facilidade. E as dores demoram a passar.<br />O que me custou não foi teres saído de casa; que tu ías sair de casa, isso já eu sabia. E quem sou eu para te impedir? O que me custa é ver-te todos os dias no trabalho, e pensar que já estivémos casados. O que me custa é pensar no Tiago, de mão na tua mão, de mão no teu cabelo, de lábios nos teus lábios, de lábios no teu pescoço, de... não penso mais, não penso mais, sequer, com medo de fazer alguma coisa que não quero (ou que quero mas que fica mal a uma pessoa fazer).<br />E no meio disto tudo, durmo numa cama de casal, faço jantar para dois, e acendo duas velas, na esperança de que, a qualquer segundo, tu abandones o Tiago e venhas jantar comigo. Tenta despachar-te, por favor, fiz o jantar há pouco tempo, não tarda nada arrefece e a comida fria não tem piada nenhuma.<br />Mas deve ser melhor assim, visto tudo: a tua mãe a perguntar-te se eu era o melhor que tu arranjavas, porque parecia que tinha vindo agora mesmo de uma guerra; tu que me pedias constantemente que não fizesse o que queria; eu que respondia, marioneta, aos teus pedidos.<br />Sim, talvez não fosse de um marido que tu precisavas: talvez precisasses de uma marioneta. E agora cortaram-me os fios, e eu encontro-me desorientado. Mas não te preocupes: eventualmente esquecer-te-ei. Não hoje, não amanhã, não depois. Eventualmente.<br />Mas o que me custa mais, sabes, é trabalhar contigo e fingir que nunca fomos casados. O que me custa mais é esperar, sozinho, pela tua companhia, se alguma vez te decidires a deixar o Tiago, então volta, sabes que tens aqui, apesar de frio, um jantar preparado para dois.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-67250358398374888512009-11-28T13:16:00.006+00:002009-11-28T17:10:40.266+00:00C'est La Musique Qui Nous TueÀs vezes, quando me encontro na simplicidade que é escrever, gosto de ouvir Yann Tiersen. Deixo os acordes simples do piano fluirem a seu bel-prazer do meu computador, na sua longa travessia até chegarem aos meus ouvidos.<br /><br />Ontem, na minha simplicidade, desliguei-me do mundo. Et la fille qui m'a fait chanter dans la pluie, soudainement, monte en ma tête, comme une memoire inconnu. Et elle me dit:<br /><br />-C'est la musique qui nous tue...<br /><br />Como um sussurro, como uma fala num filme francês, ela repete:<br /><br />-C'est la musique qui nous tue...<br /><br />e repete-se com ela um acorde de Yann Tiersen, que se prolonga, prolonga, prolonga, rumo ao que seria para nós o desconhecido, mas para ela, para ela não, o desconhecido,para ela, já foi tão explorado que não poderá nunca ser desconhecido.<br /><br />E aquela sensação de ouvir um acorde mesmo certeiro, mesmo onde era necessário, sabem?, quando um acorde (não uma música; um acorde) nos cega, nos torna insensíveis na esperança de o voltarmos a ouvir, e ela repete<br /><br />-C'est la musique qui nous tue...<br /><br />num suspiro, num desabafo, ao meu ombro, eu afasto-me car la musique, mon amour, la musique ne me toue pas; c'est toi, c'est ton corp, ton cheveux, tes mots qui me toue. Et la réalité, mon amour, c'est ton âme, c'est ton âme et ta réalité qui me toue. Car quand tu souleves ton feston, mon amour, je suis crispé, je suis admiré, je suis toué.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-57916623794329235562009-11-25T16:22:00.009+00:002009-11-25T17:55:17.821+00:00Jalousie: La première Valse<div align="justify">Chegado a salão de baile, dirigi-me ao bar. Curioso, quase que podia jurar que... não, é mesmo, é mesmo a Maria! Perfeito. Tudo corre bem...<br />Não me é difícil falar com a Maria:<br />-Maria! Está tudo bem? Queres dançar?<br />E óbvio que ela diz que sim (ela pensa que não mas eu sei, eu compreendo como ela olha para mim, como ela me fala de maneira diferente, como ela subitamente fica corada se diz algo errado à minha frente), ela diz sempre que sim, por isso não me preocupo.<br />Uma mão na cintura (e um sorriso na cara da Maria) depois, és tu quem se revela, ao som da primeira valsa. Diriges-me um sorriso, e eu já sei como tudo irá correr.<br />O leitor vai desculpar-me, o leitor vai desculpar-me mas eu não sou assim, era do champanhe, ou do vinho, ou do que quer que fosse porque eu não sou assim, foi momentâneo, mas precisava mesmo de, ao som daquela primeira valsa, ver-te sofrer, ver-te virar a cara, ver-me dormir, enfim, tranquilizar a minha consciência.<br />E ao som da primeira valsa dancei, de cintura da Maria pelo braço leve, pés leves, corpo leve, e no entanto uma consciência tão pesada, memórias tão pesadas, constantemente a serem recordadas (tão pesadas!), a contrastarem com a ausência de peso do meu corpo, dos meus braços, dos meus pés, da Maria, elefantes apoiados numa flor, e tu, um sorriso levezinho, por obrigação e etiqueta, mas doía, eu sei que doía (eu queria que doesse), porque imediatamente viraste a cara e eu lembro-me bem dos tempos que passámos juntos (só viravas a cara para chorar, para tirar o lenço da mala e chorar) em que viravas a cara, muito raramente, mas viravas a cara (virava mais eu a cara que tu, bem sabes disso), e o leitor vai-me desculpar, não me julgue, por favor, não me julgue, mas ao som daquela primeira valsa tomei a Maria nos meus braços, aproximei o meu corpo do dela e dancei a ver-te chorar, perdão!, virar a cara, esqueci-me do eufemismo, e dancei por prazer, só eu e a Maria, elefantes apoiados na flor que tu és. E o prazer daquela primeira valsa...<br />Sim!, o prazer daquela daquela primeira valsa!</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-17760657077611656362009-11-21T13:12:00.009+00:002009-11-22T07:43:54.041+00:00Eu e a Máscara: Antítese e Autobiografia-Não sou quem imaginas que sou, pois se o fosse não haveria mais nada senão sonhos. Vivemos na realidade, no concreto (por vezes também no abstracto), e nada tem significado. De que me serve pensar, se posso ver? A chuva, esse aglomerado de água cuja existência se limita a uma queda constante, não é nada senão chuva. O céu, (azul, cinzento, vermelho, ou até cor-de-rosa às bolinhas amarelas), não é nada senão um céu. O amor é um sentimento, e jamais será uma doença.<br /><br />-Não sou como imaginas que vivo, pois se assim fosse e vivesse, não seria nem quem serei nem quem sou. Porque a chuva é a chuva, e o céu é o céu, e eu sou eu. Não experimentes (não te atrevas a) dizer que a chuva é morte, e que o céu é esperança, e que o amor é uma doença, e que eu sou tudo, porque não são. A chuva é a chuva, o céu é o céu, o amor é o amor, e eu sou eu. Realidades. Acorda, ó mísero poeta desconhecido! Renasce das cinzas inexistentes!<br /><br />-Não sou quem pensas que sou, pois se o fosse não era. Porque nem o céu, nem a chuva, nem o amor, nem eu sorriem. Não os personifiques. Não são personificáveis. Não os coloques no mesmo grupo. Não são agrupáveis.<br /><br />-Não sou como imaginas que amo, pois se assim fosse e amasse, não teria amado nunca. Porque deixei de ser eu para ser tudo e todos, porque tudo e todos assumiram o meu papel. Porque sou apenas um reflexo (sou ele..., não!, melhor!, já sei!, sou o outro!) de quem não serei nunca diluído, com que já fui e sou actualmente.<br /><br />-Não sou como imaginas que penso, pois se assim fosse e pensasse, não pensaria nunca. Porque tu és fruto do meu pensamento, e eu sou obra tua. Eu não sou senão a tua pessoa, que encaro com toda a seriedade. Tu não és senão um reflexo do meu reflexo. Não sou, nem nunca serei teu reflexo nem tua imagem .<br /><br />Não sou. Deixa-me não ser.<br /><br /><br />À Filipa, que me faz ser.João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-2756004082308541342009-11-19T09:30:00.005+00:002009-11-19T10:16:33.923+00:00Os Suicidas Falam Baixinho<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMLIH2HgA3GaxmEQyeVkiZC5Ai4WUCydGcD7L8yKFvpZ40IojgEe9Cnf-FimuqCeZYYH8SFXCHTEbsJhZwHYRwW95TzT3LZNxCP7ECK3lSXrrE_IVISLZH3vj-1BkD79C9EAIdpBgNdKY/s1600/DSC00385.JPG"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 320px; DISPLAY: block; HEIGHT: 240px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5405756565283105874" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMLIH2HgA3GaxmEQyeVkiZC5Ai4WUCydGcD7L8yKFvpZ40IojgEe9Cnf-FimuqCeZYYH8SFXCHTEbsJhZwHYRwW95TzT3LZNxCP7ECK3lSXrrE_IVISLZH3vj-1BkD79C9EAIdpBgNdKY/s400/DSC00385.JPG" /></a><br /><div align="justify">acabou. com uma rapidez semelhante à da sua vinda, foi-se embora. e ainda bem. porque é melhor assim. e hoje, hoje não me vou dar ao trabalho de explicar o meu discurso. é assim que ele vai ficar.</div><br /><p align="justify">não penses que te escreverei. também não penses que agora te escrevo. não penses sequer que este pronome ("te") é indicado à tua pessoa, porque não o é. é "te". e basta. </p><br /><p align="justify">hoje não vou escrever com maiúsculas. hoje não vou falar alto. hoje comunicarei por murmúrios, sussurros, por indicações cénicas. os suicidas falam baixinho. o que se há de fazer?</p>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-4107062898690037509.post-62665331647197724102009-11-19T09:24:00.006+00:002009-11-21T15:00:03.097+00:00Voarei<div align="justify">Se tudo fossemos nós, ó meu amor, </div><br /><div align="justify">nada mais havia. </div><br /><div align="justify">E é melhor assim, meu amor, </div><br /><div align="justify">porque quero voar mais alto. </div><br /><div align="justify">Se um dia destes voar </div><br /><div align="justify">(e voarei, estou certo disso), </div><br /><div align="justify">estarás lá para o ver.<br /><br />Ou pelo menos para o sentir. </div><br /><div align="justify">Hoje irei voar. </div><br /><div align="justify">Provavelmente amanhã não. </div><br /><div align="justify">Depois de amanhã </div><br /><div align="justify">Já não sei quem és. </div><br /><div align="justify">Mas hoje irei voar.</div><br /><div align="justify">Deixarei de escrever,</div><br /><div align="justify">Uma mão, um corpo frio, </div><div align="justify"></div><div align="justify">Arrefecido pelo término da existência,<br /></div><div align="justify">Porque hoje quero voar.</div>João de Matoshttp://www.blogger.com/profile/14225983509213292389noreply@blogger.com3